A nomenclatura dos dias da semana em português tem uma relação direta com a tradição cristã, particularmente com a forma como a Igreja Católica organizava o calendário litúrgico. Nos primeiros séculos do cristianismo, havia uma preocupação em cristianizar os aspectos da vida cotidiana, incluindo a forma como o tempo era medido e os dias eram nomeados.
A palavra “feira” vem do latim *feria*, que significava originalmente “dia de descanso” ou “dia de celebração religiosa“. No cristianismo primitivo, os dias de “feria” eram dias de celebração religiosa, especialmente durante a Semana Santa, quando os dias eram numerados sequencialmente após o domingo (dia do Senhor).

A Semana Santa e os “Dias Feriais”
A Semana Santa, que antecede a Páscoa, era um período particularmente importante na liturgia cristã, com cada dia sendo uma “feria” seguida de um número que indicava sua ordem após o domingo. Por exemplo:
– Feria secunda (segunda-feira)
– Feria tertia (terça-feira)
– Feria quarta (quarta-feira)
– Feria quinta (quinta-feira)
– Feria sexta (sexta-feira)
Esses termos começaram a ser usados não apenas durante a Semana Santa, mas ao longo de todo o ano, refletindo uma prática de designação que evitava a utilização de nomes pagãos para os dias da semana.
Evitando os Nomes Pagãos
Nos territórios de língua latina, incluindo o Império Romano, os dias da semana eram originalmente associados a divindades da mitologia romana e a corpos celestes, como:
– Dies Lunae (Dia da Lua) – Segunda-feira
– Dies Martis (Dia de Marte) – Terça-feira
– Dies Mercurii (Dia de Mercúrio) – Quarta-feira
– Dies Lovis (Dia de Júpiter) – Quinta-feira
– Dies Veneris (Dia de Vênus) – Sexta-feira
– Dies Saturni (Dia de Saturno) – Sábado
– Dies Solis (Dia do Sol) – Domingo
Porém, à medida que o Cristianismo se tornou a religião dominante, houve um esforço consciente para evitar esses nomes pagãos. A Igreja, portanto, promoveu uma forma alternativa de nomenclatura, que enfatizava a santidade e a centralidade de Deus no ciclo semanal.
A Disseminação da Nomenclatura Cristã em Portugal

Em Portugal, a adoção da nomenclatura cristianizada para os dias da semana foi particularmente forte. Este sistema foi consolidado e permaneceu, diferentemente de outras regiões de língua latina onde os nomes de origem pagã prevaleceram.
Essa escolha refletia não apenas a força da Igreja na vida cotidiana, mas também um desejo de diferenciar o uso português do calendário de outras culturas e religiões. A introdução e a manutenção desse sistema estavam alinhadas com a visão de mundo teocêntrica da Idade Média, onde a religião dominava todos os aspectos da vida, incluindo a linguagem.
Domingo e Sábado: Exceções à Regra
O “domingo” e o “sábado” são exceções à regra da “feira“, e sua etimologia também reflete influências religiosas:
– Domingo: Vem do latim *Dominicus*, que significa “dia do Senhor”. Este termo é diretamente ligado à tradição cristã, que consagra o domingo como o dia de repouso e de culto a Deus, em homenagem à ressurreição de Cristo.
– Sábado: Vem do hebraico *Shabbat*, que significa “descanso” ou “cessação”. No Antigo Testamento, o sábado era o dia de descanso ordenado por Deus, após os seis dias da Criação. Embora o sábado tenha sido o dia sagrado de repouso no judaísmo, na tradição cristã, essa função foi transferida para o domingo.
Comparação com Outras Línguas Românicas
Se compararmos com outras línguas românicas, podemos ver como a tradição portuguesa se destaca:
– Espanhol e Italiano: Nestas línguas, os dias da semana mantiveram nomes baseados nas divindades romanas e nos corpos celestes. Por exemplo, “lunes” (segunda-feira em espanhol) vem de “Luna” (Lua), e “martes” (terça-feira) vem de “Marte”.
– Francês: O francês também seguiu o padrão romano com nomes como “lundi” (segunda-feira) e “mardi” (terça-feira).
A opção portuguesa de usar “feira” nos dias da semana, portanto, é única e reflete um zelo religioso em cristianizar completamente o calendário.
Conclusão
O uso do termo “feira” nos dias da semana em português é um testemunho da influência profunda que a Igreja Católica exerceu sobre a língua e a cultura em Portugal. Essa nomenclatura foi uma maneira de cristianizar o calendário, afastando-o de referências pagãs e destacando a importância dos dias sagrados na vida dos fiéis. Essa prática foi preservada ao longo dos séculos, e hoje faz parte da rica herança linguística e cultural do mundo lusófono, diferenciando-o de outras culturas latinas e reforçando a identidade histórica e religiosa de Portugal e do Brasil.
Vídeo do excelente Canal “Estranha História”
By Lito



































